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quarta-feira, 23 de fevereiro de 2011

APARENTE CONTRADIÇÃO


Jesseir Coelho de Alcântara*


Homicídio: pena de 4 anos de reclusão


Tentativa de homicídio: pena de 8 anos de reclusão



No Direito Penal um caso concreto não pode ser comparado a outro, muito embora exista o chamado instituto da analogia (ponto de semelhança entre coisas diferentes).


Muitas vezes ouvimos comentários de pessoas leigas a respeito da aplicação da pena de um réu em sentença condenatória no Direito Penal. Elas se estarrecem ao comparar o resultado de um julgamento a outro, achando muita injustiça. O problema é que o Direito não é ciência exata e em muitas ocasiões, 2+2 pode não ser igual a 4.


Acontece muita estranheza, por exemplo, nos julgamentos ocorridos no júri popular. Em muitas situações, um acusado por homicídio é condenado a uma pena de quatro anos de reclusão. Já outro réu, apontado como autor de uma tentativa de homicídio, aparentemente menos grave, recebe condenação de oito anos de reclusão. Muitos pensam: que antagonismo! Que falta de nexo!


Mas, a realidade é exatamente essa: uma aparente contradição, porém justa.


A grande questão é que jamais um caso concreto pode ser comparado a outro, situação de difícil entendimento para quem não é jurista. Aliás, até juristas batem cabeça.


Quando da elaboração de uma sentença condenatória, o magistrado deve atentar para a materialidade do fato, a autoria ou participação do acusado, além de oito circunstâncias chamadas judiciais, previstas no artigo 59 do Código Penal. São elas: a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social, a personalidade do agente, os motivos do crime, as circunstâncias do delito, as consequências do crime e o comportamento da vítima. Por aí já se vê que mui dificilmente essas circunstâncias serão sempre iguais em cada situação.


O juiz deve fixar a pena dentro dos limites legais. O julgador não pode limitar-se à apreciação exclusiva do caso, mas tem de considerar também a pessoa do criminoso, para individualizar a pena, conforme mandamento constitucional.


É por isso que na Constituição Federal (Lei Maior) existe o denominado princípio da individualização da pena. É um postulado básico da Justiça previsto dentro dos direitos e garantias individuais. Diz o dispositivo: “lei regulará a individualização da pena” (artigo 5º, XLVI). Em outras palavras: para cada réu, uma pena diferente será aplicada.


Além das circunstâncias judiciais acima apontadas, existem as circunstâncias legais, igualmente apreciáveis no decisório. Há conhecidas circunstâncias genéricas: circunstâncias agravantes e atenuantes (que aumentam ou diminuem as penas) previstas expressamente em lei, além das circunstâncias específicas, que podem ser as qualificadoras (exacerbam a pena), bem como as causas especiais de aumento ou diminuição da pena. Analisados todos esses critérios legais, o magistrado fixa a pena para o condenado.


Assim, realmente um condenado por um crime de homicídio pode ter uma pena menor do que um outro condenado pela prática de um homicídio tentado, gerando uma aparente contradição, entretanto extremamente legal.


Se a legislação é boa ou ruim, justa ou injusta, ela deve ser aplicada.


*Jesseir Coelho de Alcântara é juiz de Direito e professor em Goiânia-GO

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