Walter Menezes*
O jornalista Geraldo de Araújo Vale, natural de Orizona, filho de Idomeneu Marques de Araújo e Mariana Rosa de Araújo, nasceu no dia 23 de março de 1914. Faleceu no dia 30 de abril de 1979.
Dotado de invejável tino de observação, consagrado na imprensa goiana, era ainda filósofo como poucos, escritor, crítico e poeta.
Como repórter, marcou época com alguns dos seus trabalhos. Todos, focalizando Goiás, estado eu conheceu do “Paranaíba às confluências dos rios Tocantins-Araguaia”, como costumava afirmar. De fato, foi agenciador estatístico do IBGE – atividade que lhe deu oportunidade de conhecer todos os municípios do Estado. Escrevia com conhecimento de causa sobre qualquer assunto ligado ao interior goiano, notadamente sua história e potencialidade econômica.
Amizade, ele cultivou em todas as localidades. Daí porque obteve expressiva votação quando se candidatou, uma ou duas vezes, a cargos na esfera federal. Mais como protesto e afirmação pessoal. Vale lembrar que em décadas passadas os jornalistas eram mais temerosos em participarem da política como candidatos.
Na Associação Goiana de Imprensa foi presidente por três mandatos, todos em alternância. Jamais patrocinou a sua própria candidatura e sempre elegeu-se em oposição.
Em sua gestão aconteceu, em Goiás a Conferência Nacional de Jornalistas que prestou inestimável ajuda a Goiânia na afirmação junto ao País e ao mundo.
Também, sob a égide da AGI, em sua gestão, foi criado o primeiro curso de jornalismo em Goiás, com reconhecimento oficial inclusive. Vários dos jornalistas que militam na comunicação atual tiveram o início de carreira naquele curso ministrado pela entidade, idealizado pelo seu presidente.
Inaugurou, no recinto da AGI, um restaurante que funcionou por vários anos, oferecendo refeições fartas e com preços acessíveis aos associados.
Fundou um curso de música para os associados e dependentes e sua administração fazia com que a AGI estivesse presente em tudo que dizia respeito aos interesses de Goiás e sua gente, mormente aos jornalistas. Por várias vezes esteve na Capital da República (no Rio e Brasília), defendendo os interesses da classe. O presidente Juscelino Kubitschek tinha pelo mesmo acentuada admiração e de certa feita afirmou de viva voz: “Geraldo, as portas do Palácio da Alvorada (residência do presidente) estarão sempre abertas para você”.
Por gestões suas no IAPI (INSS de então) conseguiu financiamento para a construção de residências (boas) para 40 sócios da AGI. Democraticamente, abriu inscrições para os interessados. Entregou a execução da escolha dos pretendentes a uma comissão, a qual, por ironia, não incluiu o nome de Geraldo na relação dos beneficiados. Embora todo o trabalho para se conseguir o financiamento tenha sido feito na gestão de Geraldo Vale, a liberação dos recursos deu-se em mandato que não o seu.
Pouco dado a esmero no trajar, era quase sempre visto em um terno roto e gravata quebradiça. Mesmo assim, era bem recebido e admirado em todos os eventos de que participava, notadamente nas áreas culturais. Benquisto sempre o foi em todos os lares goianienses, mesmo porque era um “gentleman”, que dosava sempre suas palavras, razão pela qual nas residências mais nobres de Goiânia era recebido sempre de braços abertos. Em suas visitas de amizade, além de participar com desenvoltura sobre os mais variados assuntos, não se descuidava quando era convidado a dedilhar um violão ou fazer vibrar o som das cordas de um piano à vista.
Passou por vários jornais de Goiânia, como O Popular, Cinco de Março, Folha de Goyaz e outros. A muitos dos jornais e revistas de circulação efêmera, Geraldo emprestou a sua efetiva colaboração, orientando os “donos”, na maioria jovens e idealistas. Fundou, juntamente com Clotário de Freitas (na Rua 20, quem se lembra?) o jornal Nova Capital quando falar sobre a transferência da Capital Federal para o Planalto Central era coisa risível.
Homem bastante para a grande tarefa.
Por ocasião da construção de Brasília, foi um dos pioneiros, prestando inestimável serviço à Companhia de Urbanização da Nova Capital da República. A convite do seu amigo Altamiro de Moura Pacheco, aceitou fazer parte da Comissão de Desapropriação das Terras do sítio da Nova Capital. Altamiro, homem probo ao qual Goiás muito deve, viu no jornalista “o homem bastante grande para a tarefa” e sempre dizia que o mesmo era “um dos expoentes do jornalismo e da cultura em Goiás”.
Na literatura também se fez presente. Escreveu e editou vários livros. Só na Editora Oriente foram três títulos impressos.
Resistência civil
Convém recordar que na gestão de Geraldo Vale, quando a Posse de João Goulart, então vice-presidente da República, venha sendo impedida por correntes políticas e militares, na renúncia do presidente Jânio Quadros, a sede da AGI foi transformada em batalhão de resistência, tendo inclusive, dezenas de seus associados se postado em prontidão para atacar Brasília, caso João Goulart não assumisse a Presidência. A posse foi concedida, todos sabem, um tanto frustrante para o “batalhão da AGI” em decorrência da instalação apressada do parlamentarismo. Geraldo Vale, nesse episódio, não só cedeu as instalações da AGI como procurou arregimentar vários associados para a causa. Isso, com o total apoio da Assembleia Extraordinária da entidade, que contou com mais de 300 partícipes em um só ato, feito jamais igualado em toda a história da entidade.
Difícil, mesmo, falar sobre Geraldo Vale e suas realizações ao longo de sua vida. O fato é que deu tudo de si para todos e teve muitas decepções em troca.
A história fará justiça nos méritos deste que é cognominado “o príncipe da imprensa Goiânia”.
Obras de Geraldo Vale
1. Palavras do Caminho – 1965 – Premiado pela Academia Goiana de Letras
2. O Discurso de Satanás – Ficção política etiológica
3. No Cemitério das Oposições – Tragicomédia política
4. Em busca de Deus e da Paz – Filosofia
5. A Vida supera a Arte – Contos reais
6. Palavras do Caminho – Reedição – poesia
7. Ginástica e Estética da Língua Portuguesa
8. Versões e Pensamentos
9. Tenda do Caminho – Mensagens espiritualistas
10. O Poder da Prece – Concepção científica do pensamento humano e cósmico
11. A Catedral Submersa e uma noite em Pompadal – Poemas
12. Numerologia Filosófica
13. Na Seara dos Gênios
14. Filosofia da Música – Tese sobre didática musical, obra inacabada.
Muitas dessas obras estão esgotadas e algumas desaparecidas ou não chegaram a ser editadas.
*Walter Menezes, jornalista, ex-presidente da Associação Goiana de Imprensa e atual diretor do Jornal da Cultura Goiana.
12 de Abril de 2011
Fonte: Jornal Diário da Manhã
http://www.dm.com.br/#!/275457
2 comentários:
Muito bom ver que a história de Geraldo Vale não foi esquecida.
Tenho três livros dele, sendo dois citados no blog: "Em busca de Deus e da Paz" e "A Vida supera a Arte".
O 3º, que não foi citado, é da área criminal: "Documentoscopia e Grafologia".
Gostaria de saber se existe algum exemplar dos outros títulos com alguém.
Por coincidência me chamo Hélio também. Minha avó Aldair Pinheiro, tem 93 anos. E hoje (30/10/2022) conversando com ela, após ela ter ido votar no 2º turno, começamos a conversar. E ela se lembrou do escritor Geraldo Vale, de suas obras e começou a perguntar sobre seu paradeiro. Nesse momento que escrevo esse texto, estou ao lado dela, lendo o artigo, que trouxe tantas lembranças boas pra ela. Segundo minha avó Alda, ela conhecia o escritor e sua família. É muito bom auxiliar a recordar as lembranças dos nossos, que viveram em outrora. Abraços. Helinho (062 99607 0471)
Postar um comentário