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quinta-feira, 31 de dezembro de 2009

GRAÇAS A DEUS, UMA CULTURA, PORTUGUESA...


Dr.José César de Castro Barreto*

Por muitos anos, firmou-se uma lenda, entre nós brasileiros, de que a colonização portuguesa foi péssima, por serem esses colonizadores estúpidos, atrasados, etc. Deveríamos ser colonizados, para ser uma nação melhor desenvolvida, pelos franceses, que aqui aportaram no Rio, no século 16, ou pelos holandeses, que dominaram por um bom tempo o Nordeste do Brasil. São frases, que pela repetição contínua, tomam ares de verdade inquestionável.

Em 1970 estagiamos em Houston-Texas-EEUU, aprendendo Anestesia em cirurgia cardíaca a fim de iniciarmos, em Goiânia, no final daquele ano, a cirurgia cardíaca em nosso Estado. Nas folgas de sábados e domingos, passávamos quase todo o dia visitando museus ou indo a bibliotecas.

Aprendemos assim na história do Texas, que ele era um estado mexicano, desde quando o México tornou-se independente da Espanha. Os exércitos mexicanos iam àquela província, para cobrar impostos devidos ao "Gobierno Central". Contrariava uma norma, da cobrança de impostos herdados da Inglaterra, que desde 1666, o parlamento inglês tinha tirado o poder do rei, que assim o fizesse. Era o povo, por seus representantes, que taxava livremente o que a comunidade deveria pagar. Essa regra democrática econômica foi transmitida naturalmente às colônias inglesas da época. Os exércitos mexicanos chegavam a desapropriar até 50% da safra do texano, como dívida de um imposto. Revoltaram-se contra isso, formou-se um exército para combater essa espoliação imposta à força pelos mexicanos. Nesse exército havia várias nacionalidades européias que lá viviam, como também muitos mexicanos lá residentes havia muito tempo. Foram batalhas sangrentas vencidas pelos mexicanos. Não faziam prisioneiros. Afinal os texanos venceram na batalha de San Jacinto, perto de Houston, tornando-se uma nação independente. No Museu de San Jacinto, há uma frase do general texano vencedor que disse: “Aqui houve prisioneiros inimigos, junto com os heróis mortos, texanos, com suas diversas origens”. O Texas tem esse orgulho, mantém uma estrela solitária em sua bandeira, porque por nove anos seguidos foi uma nação independente. Foi uma outra batalha política, para tornar-se um estado americano. Os nortistas, anti-escravagistas não queriam, por ser um estado do Sul, que iria aumentar os votos sulistas escravagistas. Os sulistas não queriam um estado onde não havia escravidão.

Nessa mesma biblioteca, encontramos outro livro fascinante: A História das Colonizações nas Américas. Situava as colonizações em relação à colonização inglesa, com suas famílias, cujo objetivo final a ser alcançado era fixação na nova terra, com princípios religiosos, firmados na liberdade de crença (na Europa não existia). Com princípios políticos de liberdade. Com a tradição inglesa nas cobranças de impostos e na nova terra teria livre oportunidade de trabalho. Estes princípios básicos da colonização inglesa foram o motivo principal do México ter perdido sua província – Texas, que na época já tinha absorvido essa cultura britânica. Os espanhóis foram predadores. Chegaram em busca de riquezas. De modo autoritário, escravagista, punham seus exércitos à procura da prata, com a finalidade de voltarem ricos para a Europa. Não tiveram, como a colonização inglesa, o objetivo final de criar uma outra civilização. Os reis espanhóis doavam pedaços de terra nas Américas, com o fim do donatário explorar as riquezas da região e levá-las para a Espanha. Tiveram a oportunidade ímpar, quando descobriram e tomaram posse, duas civilizações americanas, em muitos aspectos, superiores à da Europa. No México, os aztecas, e no Peru, os incas. Tinham agricultura avançada, com curvas de níveis antierosão do solo; o milho híbrido; os saneamentos básicos, com drenagens de águas e esgotos; uma medicina superior à européia, onde faziam até trepanações¹; o conhecimento da astronomia e da astrofísica. Não conheciam a pólvora nem o cavalo. Foram dizimados, mortos, escravizados e roubados em sua grande riqueza de ouro e prata. Seus prédios e casas foram destruídos, sendo hoje ruínas. Esse livro enfatiza que a colonização hispânica, que iria desde o Colorado até a Patagônia, na Argentina, seria o maior país das Américas, se seguisse os princípios da colonização inglesa.

Igualmente o livro realça que a colonização francesa tinha o mesmo objetivo de rapina. As colônias erguidas nas Américas pelos franceses, foram vendidas para os americanos, quando estes já eram independentes. Ficou somente um quisto dessa colonização no Canadá. Com os holandeses aconteceu igual aos espanhóis e franceses, com a mentalidade de extrair o máximo nas novas terras e depois voltar para Europa. Nova York foi vendida para os ingleses. Restaram somente algumas ilhas no Caribe e o Suriname, antiga Guiana Holandesa no norte da América do Sul. Não se fixaram nem tentaram expandir-se.

Já era tarde de domingo. Paramos com a leitura do livro, adiando para o sábado seguinte a leitura da colonização portuguesa. Ficamos deduzindo que seriam terríveis verdades, iguais às que já tínhamos lido, de outras colonizações em relação à inglesa. Como teria sido nossa colonização pelos portugueses? Essa apreensão durou uma semana. Foi surpreendente, ao depararmos logo no início, quando afirmavam que foi uma colonização de fixação, ao tomarem posse da nova terra e com o objetivo de também se expandirem, como na colonização inglesa. Portugal já tinha uma enorme experiência de colonizações, nas ilhas atlânticas, na África e no Extremo Oriente. Antes da descoberta do Brasil, já tinha firmado o Tratado de Tordesilhas com a Espanha, os dois países mais ricos daquela época, com o aval do papa, assinado em Roma. Já era então de seu conhecimento e o “descobrimento” seria logo um fato consumado. Tomaram posse da nova terra, firmando seus marcos de posse para a coroa de Portugal. Trouxeram a fé cristã, com o objetivo de levar aos indígenas a salvação da alma. Portugal, um reinado autoritário com uma imensa e madura experiência de colonizações, trouxe para o Brasil um poder hierarquicamente ligado ao rei, por intermédio de um governador-geral. Esse tinha treze substitutos já destacados pelo rei, na falta por óbito do governador. Devido à extensão territorial, foi a colônia dividida em doze capitanias e todas com representantes do rei. Depois, com o surgimento da exploração do plantio da cana-de-açúcar, a colônia foi dividida em dois governadores. Mais tarde voltou a ter somente um governador-geral. Esses fatos explicam a determinação de Portugal de se fixar e com a certeza, de um dia, como os espanhóis, no oeste, achassem o ouro. Inicialmente, o principal fator econômico foi a exportação, para a Europa, do pau-brasil, uma madeira de lei que tinha a propriedade também de fazer uma tinta. Essa madeira mudou o nome da colônia de Terra de Santa Cruz, para simplesmente Brazil. Depois veio o ciclo econômico da exploração da cana-de-açúcar. Portugal, por oitenta anos, foi o maior produtor mundial de açúcar e monopolizava também sua distribuição, por intermédio de sua grande frota de navios mercantes. Essa riqueza levou o rei de Portugal a ser mais rígido com a administração no Nordeste e deixar mais livre o Sul da colônia. Com isso surgiram os bandeirantes em São Paulo, que foram incentivados a deixar caduco o tratado de Tordesilhas, indo atrás das esmeraldas, ouro e outras riquezas. Levaram as bandeiras, desde o Sul, pelo Centro-Oeste, chegando até a Amazônia. Ficavam nesses lugares os marcos de posse da coroa de Portugal. Cresceu a colônia três vezes seu tamanho territorial e acharam o ouro, duzentos anos após o “descobrimento” em lugares de difícil acesso, mas de fácil defesa. Como nos EEUU, foi um motivo de grande expansão territorial.

Essa corrida para o Oeste teve um importante detalhe. Quando os americanos descobriram o ouro, já era um país independente, ficaram com o ouro. O Brasil continuava colônia de Portugal. Apesar de ter extraído cinco vezes mais ouro do que os EEUU, nunca foi beneficiado por essa riqueza, pois esse ouro foi para Portugal, depois imigrado, por intolerância religiosa, para a Inglaterra, onde foi o principal fator do início da revolução industrial da daquele país. Veio influenciar também a industrialização do norte da América. Outro fato fantástico, revelado nesse livro, foi a influência decisiva de Napoleão na Independência do Brasil!

Quando os franceses invadiram a Península Ibérica, a corte portuguesa fugiu toda para o Brasil. Trouxe D. João VI a abertura dos portos, a fundação do Banco do Brasil, fundou escolas universitárias, o Jardim Botânico, etc. Quando voltou a corte para Portugal, com a derrota de Napoleão em Waterloo, D. João VI deixou seu filho como regente, dizendo-lhe, que em dúvida, “coloque em sua cabeça a coroa imperial, antes que algum aventureiro assim o faça”. Esses benefícios trazidos por D. João VI levaram o país a lutar por sua independência, principalmente para uma imprensa livre, proclamando D.Pedro I em 1822, a Independência do Brasil. Tornando-se um império, o quinto país do mundo em extensão territorial, falando a mesma língua, sem separação de raças, sem discriminações religiosas. Graças a Deus, uma cultura tipicamente portuguesa.

¹Técnica cirúrgica que consiste em perfurar um orifício em um osso, especialmente do crânio.
*Dr. José César Barreto é médico-anestesista em Goiânia. Por seus inúmeros cursos e congressos médicos de que participa no mundo todo, e suas teses apresentadas, é considerado cientista de destaque no campo da Medicina. Como livre pensador, manifesta preocupações com os problemas dos nossos dias, apresentando soluções lúcidas e admiráveis.

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