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quinta-feira, 14 de outubro de 2010

MULHER NÓ


Alaôr dos Anjos*

Seu AZARINO, homem trabalhador, era ferreiro, assim contava minha mãe. Nasceu em Ouro Fino, mas fora criado em Vila Boa. Como bom profissional, tinha boa freguesia. Era remediado. Trabalhava de sol-a-sol, fazendo ferrões para cutucar bois de carro, esporas para montador de cavalo, bacias e copos de lata. Pregava ferraduras em animais de carga. Amolava facas, tesouras e canivetes. Era árduo o seu labor.

Á tarde seu AZARINO retornava ao seu barraco lá no quebra-coco. Sentindo-se só, às vezes, ele monologava: “Ah se eu tivesse mulher! Tudo seria diferente. Teria comida, no tempo e na hora, roupa lavada, costurada, além do carinho da mulher amada”. Pensava seriamente em se casar. E, num domingo de retreta, conhecera NORBERTINA, no jardim, junto ao coreto. Moça bonita, de ancas grossas, morena e tímida.

Naquele tempo as mulheres eram mais femininas e delicadas. Seu AZARINO apaixonou-se por aquela prendada moça de família. Com o namoro firmado, o noivado pedido e aceito, o casamento realizou-se em poucas semanas. Seu AZARINO vivia feliz. Era homem casado.

O tempo foi passando e dona NORBERTINA não cuidava do lar. Do lar só não, dela também. Era descuidada e ociosa. Quando as suas roupas rasgavam, dava-lhes nós. Muitos nós. Seu marido, de ver tanto nó, nó daqui, nó d'acolá, cansado dessa vida malograda, certo dia numa briga de casal, pediu a Deus para que ela morresse.

Passados alguns anos, acometida de estranha doença, não diagnosticada pelos médicos de então, morre Mulher Nó.

Sete anos depois, de cômoda e tranquila viuvez, mas assediado por mulheres bonitas, seu AZARINO casa-se novamente com dona RITINHA DESNOSADA. Esta era mais ociosa do que a primeira. Quando suas roupas rasgavam nem nós dava ela. Rasgava daqui, rasgava dali e d'acolá, nada de nó e nem de costurá-las, deixando tudo ao deus-dará. Até que um dia, farto de ver tanto desleixo, seu Azarino foi até o quintal e com os braços erguidos, a cabeça inclinada, ao firmamento de luz, rogou: Deus! Dê o céu a minha Mulher Nó, porque essa nem nó saber dar.

*Alaôr dos Anjos é escritor, advogado e integrante da Associação Goiana de Imprensa.

Imagem: http://img.mercadolivre.com.br/jm/img?s=MLB&f=90378249_5590.jpg&v=P

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